Cinema: "A sombra das mulheres" de Philippe Garrel

Nº 1735 - Primavera 2016
Publicado em Cultura por: Dulce Rebelo (autor)

Philippe Garrel é o legítimo herdeiro de Jean-Luc Goodard, o mestre incontestável da "Nova Vaga" francesa, influenciado pelos acontecimentos de Maio ocorridos em 68, e que nos conta as mudanças sociais e políticas ou dificuldades do relacionamento humano, e a importância do amor, após aquele evento histórico.

Garrel no filme aborda a complexidade da relação amorosa, com o seu fulgor e contradições, mediante a observação da vida dum casal. Pierre (Stanislas Merhar) e Manon (Clotilde Courau) que trabalham juntos na realização de filmes. Ganham pouco, têm dificuldade em pagar o modesto apartamento que habitam, mas amam-se.

No entanto, durante a rodagem dum documentário Pierre envolve-se com a assistente Elisabeth (Lena Pougam), tomando-a como amante. Pelo seu lado Manon, sem saber da traição do marido, também arranja um amante.

Descoberta a situação, segue-se uma série de reflexões sobre o que é a característica da "masculinidade" e não aceita, portanto, numa mulher, situação idêntica surgindo a falaciosa discussão sobre quem tem mais "direito" a trair.

A história intemporal, filmada a preto e branco, que tem como fundo a voz do narrador (presença discreta de Philippe Garrel) faz-nos reviver os contos morais de Jean-Luc Goodard, pela temática, pela reflexão sobre os problemas das relações humanas num mundo que já mudou e onde o conceito de família já não é encarado da mesma forma.

Sabe bem, após o visionamento de tantas filmagens sobre "robots" maléficos e seres humanos estripados, "entrar" nesta conversa intimista sobre as relações de amor e de amizade de homens e mulheres do mundo real que vivem os seus dramas e procuram resolvê-los com tristezas e alegrias no diálogo, fazendo ouvir as suas razões.

Os actores, protagonistas do filme, revelaram numa entrevista como gostaram de fazer este trabalho em conjunto com o realizador, em que houve tempo para desenvolver a acção, troca de ideias, partilha e respeito mútuo, pois Garrel tem uma verdadeira devoção pelos seus actores e actrizes.

O filme foi escolhido para a Seleção Oficial do Toronto Internacional Film Festival e obteve o Prémio Melhor Actriz no "Sevilha Film Festival".

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